Dicas de jornalistas para escrever textos criativos
 



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Dicas de jornalistas para escrever textos criativos

Escrita Criativa


Dando continuidade à série de artigos com dicas de diferentes profissionais para escrever textos criativos, hoje é a vez dos jornalistas.

A criatividade pode se fazer presente em qualquer tipo de texto e cada profissional tem muito a agregar para que ela faça parte da sua rotina de escrita.

Confira as dicas de quatro jornalistas para escrever textos criativos:


| CARLOS SCOMAZZON


Alguém já declarou que o contrário da escrita jornalística é complicar aquilo que deve ser simples, claro e direto. Já o escritor português Júlio Dantas dizia que "o que é difícil não é escrever muito, mas dizer tudo escrevendo pouco". A seguir, tentei elencar mais do que dicas, alguns parâmetros que sempre me nortearam para escrever, seja no jornalismo, seja fora dele:

1. Dominar o texto básico

Todo jornalista ou escritor iniciante deve buscar, primeiramente, o domínio das estruturas mais elementares do texto - sintaxe, estruturas das frases, regras ortográficas e de pontuação, por exemplo, são pré-requisitos. Sem antes dominar estas regras básicas do "texto quadrado" (aquele tipo de escrita mais trivial, sem enfeites ou rodeios, que usamos para redigir pequenas notas ou notícias meramente factuais) não podemos ter a pretensão de escrever textos longos, densos ou autorais, com estruturas frasais mais complexas. Dominar estas estruturas básicas do texto curto e objetivo diminui muito o risco de erros crassos para o iniciante.    

2. Simplicidade

Buscar a simplicidade ao escrever um texto, seja ele jornalístico ou não, deve ser um objetivo permanente para quem escreve. Criatividade e originalidade exigem disposição ao trabalho e não combinam com improvisos e atalhos fáceis. A obsessão pelo texto "genial" pode levar o autor a um resultado ruim e contrário ao pretendido.

Para escrever com clareza, exercite sua capacidade de síntese. Revise todo o texto quantas vezes forem necessárias desde o primeiro rascunho. Quando você achar que chegou ao formato ideal, ainda desconfie e revise novamente. Você vai se surpreender ao constatar que ainda deve encurtar e reescrever frases, buscar outros caminhos para o texto, até chegar ao formato que você realmente considere mais próximo do ideal. O desafio do jornalista e do escritor é fazer com que o leitor se interesse pelo texto. Na escrita, só a simplicidade consegue isso.

3. Estilo

Tanto o jornalista quanto o escritor adquirem estilo próprio de escrita ao longo da sua trajetória. O estilo é consequência direta do trabalho contínuo de escrever. Todo jornalista escreve textos a partir de um ponto de vista muito particular, mesmo quando pretende ser objetivo e imparcial. Essa subjetividade presente na abordagem também será ingrediente para moldar o estilo do texto autoral. Resultado do amadurecimento, o estilo, na escrita, permite ao leitor reconhecer a marca do autor. Como nos ensinou o jornalista e escritor Gay Talese, "todos escrevemos a partir de um lugar de subjetividade, somos pessoas e produto de várias experiências".

4. Leitura

Leia, leia muito. Ninguém consegue escrever bem sem ler muito. É a leitura que nos abre caminhos para a escrita, fornecendo informações, mostrando formas diferentes de escrever um texto e nos tornando mais íntimos das regras formais de ortografia e pontuação. Ela nos ajuda a encontrarmos o nosso próprio método para escrever. Transforme todas essas referências das suas leituras em algo pessoal. Muita leitura pode ser o caminho mais curto para a formação do estilo próprio na escrita.


| JAMYLLE MOL


1. Saber ouvir

O bom repórter é aquele que ouve com atenção, que nota os detalhes, que vê o extraordinário no ordinário. Na Literatura, um detalhe simples – como uma pedra no meio do caminho – pode ser o impulso para uma grande história.

Às vezes, quando estamos começando na carreira literária, procuramos enredos que chocam, que impactam pelo extraordinário que são. Contudo, tramas simples, cotidianas, mas com personagens interessantes, podem emocionar ainda mais e dar o efeito impactante que tanto buscamos. 

Para trabalhar a criatividade, prestar atenção no comum é um bom passo. Reparar na reação das pessoas, em como elas agem e reagem no dia a dia. Ouvir e ouvir realmente.

2. O enquadramento

Esse conceito, usado no Jornalismo, é uma estratégia eficiente para escrever textos criativos. Enquadrar é escolher o que fará parte de uma narrativa que contará a história.

Em uma notícia, enquadrar é decidir quais fontes ouvir, quais dados numéricos inserir, a quais fotos e gráficos recorrer... Na Literatura, o uso é similar. Se quero escrever uma história, é preciso escolher qual recorte darei a ela.

Eu, por exemplo, escrevo sobre roça, sobre a vida no interior. Não posso contar absolutamente tudo sobre esse universo. Mas preciso escolher um recorte, um enquadramento pequeno que falará desse todo, que dará ordem e sentido à história que quero contar. Como o jornalismo e a fotografia, é preciso delimitar para realmente dizer.

3. O protagonista é a história – não quem a escreve

Escrita e ego costumam andar de mãos dadas. No Jornalismo, uma das primeiras lições que aprendemos é que a protagonista é a história, não os repórteres.

Na Literatura, essa dica pode ser útil em texto autoficcionais, quando nos prendemos excessivamente à verdade dos fatos e nos esquecemos do ritmo, do encanto, da verossimilhança da história que estamos contando.

Em um texto criativo, seja ele autoficcional ou não, dar à história o devido protagonismo é uma maneira de não perder essa verossimilhança e não nos prendermos tanto a uma ideia inicial, que nem sempre funciona quando a escrevemos.

Dica bônus: a simplicidade

Um dos grandes desafios de todo “foca” (como são chamados os jornalistas em começo de carreira) é ser simples. Deixar de lado os adjetivos, as palavras rebuscadas, as orações com ordens avessas, os tempos verbais que já ficaram no passado.

Na escrita de textos criativos, o “ser simples” é, ao meu ver, um dos grandes desafios. Não é uma tarefa fácil ser simples. Quando Guimarães Rosa escreveu “Uai, Mãe, hoje já é amanhã?”, recorreu à simplicidade de uma criança.

O ser simples é uma grande ferramenta na escrita – e na escrita assertiva especificamente. É preciso trabalho e um trabalho de lapidar a escrita constantemente.


| GUILHERME BARCELLOS


1. Manter um swipe file

Essa é especialmente útil para quem trabalha com marketing digital. Um swipe file nada mais é que um reservatório de textos. Nele você vai guardar chamadas/anúncios/cartas de vendas e demais copies de outros copywriters e inclusive seus também. A ideia aqui é compilar bons textos e trazer aquela inspiração na hora que estivermos criando um conteúdo. Inclusive, embora essa prática seja mais comum para quem trabalha com copies de marketing digital, ela pode ser usada para outros formatos de produção textual também, claro, desde que não sejam textos muito grandes. 

Dica da dica: você pode usar extensões do Chrome, como o Evergreen Notes, ou mesmo criar um doc no Google Docs para manter seu swipe file. Lembre-se que precisa ser um arquivo de fácil acesso para rolar aquele ctrl c + ctrl v toda vez que ver uma ideia interessante. 

2. Separar um tempo para buscar referências

Pode parecer óbvio, mas talvez por isso gere tanto resultado (inclusive muitas pessoas bem-sucedidas afirmam que o básico bem feito dá resultado, então, bora focar no básico). Separar um período do dia, seja 10 minutos, meia hora ou algumas horas (dependendo da flexibilidade do seu trabalho) buscando referências ajuda, e muito, na hora de criar conteúdo textual novo. Foque nisso que a qualidade dos seus textos vai melhorar substancialmente. 

3. Foque em responder a uma pergunta 

Às vezes o bloqueio criativo vem com uma força avassaladora e parece não ter fim. Nessas horas é bom utilizar perguntas como norte, especialmente aquelas mais instigantes, para dar a partida. Em seu livro "Outliers", Malcolm Gladwell faz isso com maestria, construindo tópicos inteiros em cima de uma pergunta como "por que os asiáticos são tão bons em matemática?". Esse macete ajuda tanto pelo viés de "buscar a resposta para a pergunta e, por consequência, um conteúdo em cima disso" como para soltar a mente e começar a costurar uma frase atrás da outra. 


| GUILHERME WUNDER


1. Pergunte tudo

Muitas vezes o jornalista sai da redação com a pauta pré-pronta e fica receoso de fazer perguntas que considere "burras". Não pense assim. É possível que todos pensem o mesmo e a pergunta mais simples fica sem resposta. Estude o entrevistado, mas pergunte tudo o que acredita ser importante;

2. Tente deixar o entrevistado à vontade

Brinque e faça perguntas que ele gosta de responder antes de começar com os questionamentos mais tensos. Muitas vezes isso ajuda o entrevistado a se sentir mais à vontade e te contar coisas que ele normalmente não conta. O ambiente de uma entrevista é muito importante.

3. Fuja da pirâmide invertida

Se você é estudante de jornalismo, não mostre isso para o professor, pois eu serei execrado (risos). Sei que o conceito da pirâmide invertida é importante, mas tente escrever algo fora da caixa. Se preocupe em contar a história de forma linear e que facilite a compreensão do leitor. Isso é muito usado no jornalismo literário e em reportagens de fôlego. 

 

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